segunda-feira, 8 de junho de 2009

"Intelectus interruptus": até um dia

Caros colegas bloguistas, chegou ao fim um ciclo da minha "condicao intelectual" de bloguista, e volto ao activo na minha carreira de Jornalista. Porque este meu blogue pretendeu sempre ser um espaco imparcial, isento, independente sobretudo, na observacao e analise dos fenomenos e efeitos mediaticos em Mocambique, o meu regresso ao Jornalismo activo condiciona tais pressupostos/principios da minha actividade aqui.

Um dia voltarei...

Aquele abraco amigo

quinta-feira, 9 de abril de 2009

O “caso Muananthata” e a promiscuidade no jornalismo moçambicano

“Moçambique enferma do síndroma de permissividade” (Ungulani Ba Ka Khossa)

“Toda a sociedade que não é esclarecida por filósofos é enganada por charlatães” (Condorcet)

1. Estava à procura desta oportunidade! Eu, Milton Cesário Banze Machel, me confesso, nestas coisas sou um oportunista, um verdadeiro “mahupeiro” da estirpe de “Totó” Schillaci nas peladinhas do “xipawana” e do “gulamussene”! Por isso, venham comigo neste “tour de force” ao meu estado de inquietude, quando o assunto é jornalismo moçambicano: essa minha eterna amada, qual “aquela cativa que me tem cativo” de Camões, esse meu mal-me-quer, bem-me quer...

Comemora-se sábado, 11 de Abril, mais um Dia do Jornalista Moçambicano, como entrada assim para mais um mês e meio dedicado à Liberdade (esse valor-supra sumo à existência do homem, como ser social e animal político). Por ocasião disso, o Conselho Superior da Comunicação Social (CSCS) e o Sindicato Nacional dos Jornalistas (SNJ) decidiram promover um debate subordinado ao tema “O Desenvolvimento da Comunicação Social em Moçambique: Aspectos Legais e Éticos”.
Diria o meu bom escriba amigo, eterno camarada de ofício (o destino dos poetas são as palavras...) e escrevedor de destinos, Nelson Saúte – a quem roubei esse vício/pretensão de ser enfático e peremptório –, “É salutar!”, esta iniciativa do CSCS e do SNJ.

Saudável - acrescentaria o meu professor bloguista da cadeira de Dúvida Metódica: Elísio Macamo - pelo facto de termos de ser uma sociedade de debate. Louvável, diria eu, neste País que cultiva os Feriados, as Tolerâncias de Ponto e as Efemérides como “momentos de reflexão” qual sociedade de filósofos (diz Karl Popper, o homem da Sociedade Aberta, que todos os homens são filósofos...uns mais do que os outros, acrescentariam os que se querem “exclusivisar” no Clube dos Filósofos, reservando-lhe o direito de admissão).

Oportunista como gosto de ser, aproveito este ensejo do debate promovido por aqueles organismos tutelares dos media e da profissão de jornalista para os provocar e a toda a sociedade moçambicana alcançável via blogosfera sobre dois pontos que balizam o tema do debate de sexta-feira, 11 de Abril de 2009: o Legal e o Ético.

2. O recém-despoletado “Caso Muananthata” serve de mote para as questões que a seguir levanto e que, a meu ver, são de certo modo reveladoras do Estado dos Media (pois, para mim, quem faz o Estado, as instituições e as organizações é o homem que neles desempenha papéis e funções, se eu fosse Nicolau de Copérnico ou Galilei Galileu enunciaria a Teoria Homocêntrica, que o Homem é o Centro do Universo, e que tudo gira à volta dele, mesmo que os teo-fundamentalistas de hoje me condenassem à fogueira!).

Para quem não sabe, o “Caso Muananthata” foi assim baptizado porque há umas semanas o Governador da Província de Tete, Ildefonso Muananthata, foi acusado pelo jornalista do “Notícias” Bernardo Carlos de o ter, alegadamente (ou supostamente?, como gostam os jornalistas de escrever), ameaçado de morte: a polémica é que o Governador estaria desgostoso com os escritos “rebeldes” (palavra minha) daquele jornalista do matutino dito oficioso, e que por via disso teria dito que ele corria risco de acabar como a legenda do Jornalismo (de Investigação) Moçambicano Carlos Cardoso, pois Bernardo Carlos poderia “perder esse cotovelo com que me acotovelas”.

Depois do “j’accuse” de Bernardo Carlos e supostamente o testemunho de quatro colegas de profissão que presenciaram a cena, e com a consequente mediatização do caso (não era para menos!, poderá tratar-se de um atentado à liberdade de expressão e uma ameaça à vida do Bernardo Carlos, se provada em sede própria) tudo virou do avesso.

Do “j’accuse” de Bernardo Carlos passou-se para uma autêntica sessão de “jaccuzi”: três dos colegas (por sinal dois em órgãos públicos, TVM e RM) desmentiram ter testemunhado em favor de Bernardo Carlos e de subscreverem os termos da acusação, enquanto um (do Diário de Moçambique) fincava pé que sim, é(ra) verdade o que acontecera e tal como se descreve que aconteceu.

O caso não ganharia contornos suspiciosos e não me levaria a colocá-lo no “cesto da promiscuidade” se a figura responsável pela sua clarificação ou resolução não desempenhasse os duplos papéis que a media lhe atribui: delegada provincial da secção moçambicana do MISA e adida de imprensa do Governo Provincial de Tete. Como disse!? Delegada do Media Institute for Southern Africa/Instituto de Comunicação Social para a África Austral e em simultâneo adida de imprensa do Governo de Tete!
Aí é! Qual a fronteira, na actuação que ela teve neste caso e no desempenho da sua função no MISA, entre o defender os interesses do jornalista e da liberdade de imprensa vs defender interesses de quem lhe paga o salário como assessora para a ligação com os media? Onde está o Legal da questão? Onde está o Ético da questão?

3. Porém, para demonstrar que não se trata de um caso isolado nos nossos media, chamo à vossa atenção estes casos que para mim entram no “catálogo da promiscuidade” e são auto-ameaças ao exercício da liberdade de imprensa, à independência, à imparcialidade, à isenção (espero que o adido de imprensa do Ministério do Trabalho e às vezes jornalista do semanário desportivo Desafio, Jafar Buana, não venha brandir que está aqui mais um caso que prova que a blogosfera moçambicana é espaço para se acusar pessoas e lesar honras e reputações).

- O até há pouco tempo representante das Empresas Jornalísticas (entenda-se sindicato dos patrões da media privada no CSCS), para além de ser jornalista em pleno direito no seu O Popular Fim-de-Semana, é(ra) assessor de imprensa da empresa que brilha “amareladamente” no “Big Five” do índice das 100 Maiores Empresas de Moçambique da firma de consultoria e auditoria KPMG. Pergunto pela segunda vez: Onde está o Legal da questão? Onde está o Ético da questão?
- Enquanto durou o mandato de David Simango como Ministro da Juventude e Desportos (MJD), até ele assumir a Presidência do Município de Maputo, o assessor de imprensa do Ministério da JD era um redactor (jornalista) desportivo do matutino “Notícias” – curiosamente, ele é meu ex-chefe de redacção no saudoso e extinto jornal “Campeão”. Coincidentemente, ele foi substituir outro jornalista do mesmo jornal que assessorava o bonacheirão Joel Libombo nos últimos anos do seu mandato de MJD. Repito a questão: Onde está o Legal? Onde está o Ético?
- Em Manica, um jornalista e colunista do mesmo “Notícias” (eish, anima ser jornalista no Notícias!), até última notícia de que eu tenha conhecimento, é(ra) em simultâneo delegado provincial do SNJ enquanto “comia” um pouco da “mola” do erário (público) como adido de imprensa do Governo da província. Acho que já é redundante eu retornar àquela questão, mas, se perguntar não ofende, nem é crime...
- Em Inhambane, um jornalista e também colunista do mesmo “Notícias” (xi, outra vez!!!, acho que começo a ser um atentado ao nosso grande diário!) desempenhou até há uns tempos a função de adido de imprensa do Governo da província. Ainda é preciso perguntar, de novo!?

Para terminar, um caso à parte: o irreverente e dissidente jornal Zambeze acusou em Editorial, há uns meses, o Director Editorial do semanário Domingo e agora representante das Empresas Jornalísticas no CSCS e novo Administrador-Delegado da Sociedade do Notícias de “receber algum” por assessorar o Conselho de Administração das Linhas Aéreas de Moçambique. O Zambeze não chegou a apresentar provas, fê-lo em sede de coluna de opinião, mas, ao que me parece, não foi desmentido publicamente nem processado judicialmente. O que levanta suspeições, o que não é nada bom para a reputação de uma figura respeitada no jornalismo moçambicano, cuja integridade até hoje não sofreu máculas nenhumas, por quem tenho particular apreço e aprendi a admirar desde os tempos que minha mãe oficiou no Notícias e eu reverenciava aquela casa (que até hoje considero, sem catolicismos nenhuns, “a catedral do Jornalismo Moçambicano”).

Depois deste meu arrolar de casos (infelizmente, acredito haver mais!), que considero inescreverem-se no âmbito de uma prática de promiscuidade nada abonatória e pouco salutar ao exercício da liberdade de imprensa, à profissão de fé na imparcialidade, na isenção e na independência, lanço aqui o desafio ao SNJ, ao MISA, ao CSCS e aos colegas para debaterem a questão da Legalidade e da Ética no Jornalismo não como quem “discute o sexo dos anjos”... pois o “Cavalo de Tróia” dessas práticas promíscuas está a invadir o nosso jornalismo.

Não vou cometer a ousadia de acusar o MISA, o CSCS e o SNJ de pactuarem com essa promiscuidade, pois não tenho provas de que façam vista grossa àquele funcionalismo dúplice de figuras a estes organismos ligadas. O Objectivo desta postagem é tão só discutir essa duplicidade e incompatibilidade de papéis que cada vez mais crescente número de jornalistas desempenha. Esta postagem quer-se apenas mais uma contribuição ao debate do Legal e do Ético, por um jovem jornalista (na reserva) para jornalistas, patrícios e camaradas de ofício.

P.S.1: Tenho saudades de Leite de Vasconcelos, por isso vou voltar a ler, pela enésima vez, o seu “Pela Boca Morre o Peixe”.

P.S.2: Para quem queira entender dos efeitos nefastos dos “agentes duplos”, recomendo a leitura da obra “Agente Zigzag”, de Ben McIntyre, que fala da improvável estório do “duplo agente” e provavelmente “triplo agente” Eddie Chapman, que qual espião que veio do glacial leva a vida no arame brincando com os serviços secretos britânico e alemão no tempo da Segunda Guerra Mundial.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Há mais jornais, mas há pluralismo?

1. Uma das jubiladas conquistas da Democracia à Moçambicana é o exercício constitucionalizado e institucionalizado da liberdade de imprensa e a decorrente livre iniciativa privada, tendo como exemplo paradigmático a sanha cogumélica de surgimento de jornais, quer na vertente electrónica (os faxes ou de circulação por email) como nos semanários tablóides (no formato, se bem que alguns se confundam de facto com os famosos, quero dizer, famigerados junkie tabloid britânicos... sensacionalistas).

Hoje por hoje, em semanários (meu campo preferido dos media) temos uma fauna com “animais” como Savana (com a melhor equipa de opinião do País), Domingo (cultor das melhores grandes reportagens, palmilhando e calcorreando o País real), Zambeze (o mais irreverente, amiúde dissidente), Magazine Independente (nome peregrino este para um jornal semanário!, mas que vale pelo melhor editorialista do País), Escorpião, Público, Wamphula (em Nampula) e o saudável @ Verdade (mais adiante vou justificar por quê deste adjectivo).

2. Este post teve três momentos fundadores. O primeiro foi o desafio que o meu professor de Relações Públicas, Dilip Navalshankar, fez a mim e meus colegas do bacharelato em Ciências da Comunicação n'A Politécnica: que cada um escrevesse seu Memorial Crítico, o qual não só descrevesse o itinerário por cada um trilhado no campo da comunicação social mas que constituisse uma bússola de orientação de futuros temas para trabalhos de fim de curso. Lá fui ao meu pocket PC buscar algumas notas que venho tomando ao longo dos anos, tendo elencado alguns temas, um dos quais a epígrafe - como proposta de pesquisa.

O segundo momento foi quando, ao recomendar por SMS a alguns amigos que lessem o Editorial desta semana do Savana sobre a Guiné-Bissau (disse-lhes, enfático e peremptório como gosto de ser, “é uma lição de história!”), o Ericino de Salema assentiu, tendo contudo aproveitado a deixa para desabafar que a qualidade do jornalismo estava a baixar cada vez mais, reclamando que os assuntos são os mesmos, as abordagens as mesmas, idem as “análises” (direitos de autor: as aspas são dele).

O terceiro “momento a-haa” para esta postagem foi quando conversava com um amigo meu que tem o dobro da minha idade, cuja casa de pasto recebe todas as semanas uns tantos dos 50 mil exemplares que o único jornal gratuíto do País e com melhor qualidade (cor e papel) de impressão distribui semanalmente.

Discorriamos, pois, sobre o mérito do @ Verdade versus demérito do grosso dos semanários: pela pretensão de serem jornais de referência, tratando de hard news, todos eles praticamente versam sobre as mesmas matérias, consultam as mesmas fontes, têm as mesmas abordagens (de formato, extensão das estórias, no conteúdo e pelos ângulos aplicados) e andam todos seguidistas e cegos atrás de fait divers da corrupção e burocratismo no sector público, das polémicas dos casos quentes e males da nossa Justiça e da política politiqueira da FRELIMO e seus sibindizes acólitos da oposição construtiva, atrelados às dhlakamices e mazanguices...; em contrapartida, o @ Verdade propõe-se trazer um outro lado de Moçambique, uma visão positiv(ist)a das coisas boas e mesmo más da nossa terra, de contar apaixonantes human interest stories que retratem os desafios de desenvolvimento, de resgatar estórias must read do nosso quotidiano, estimulando o debate saudável de assuntos candentes ao jeito de soft news, de leituras de fim-de-semana. Uma forma, diriam os americanos, de dissimular ser silly tratando de serious issues. Prova disso, a ultima edição do jornal do Erik Charas traz uma estória – “biografia (positiva) de mel” - de uma jovem heroína na luta contra o SIDA, contra o estigma e a descriminação - leiam, felizmente este jornal arrancou logo com edição online em simultâneo com a impressa.

3. São estas untold estórias da vida real, estas abordagens frescas e resgatadoras do Jornalismo Narrativo, que junto com o Jornalismo Investigativo (que persegue e constrói dossiers e folhetins, que permite fazer hiperligações e desvenda conexões, que aprofunda e problematiza, e que proporciona exclusivos/scoops) marcam a diferença e nos fazem acreditar no valor da pluralidade e da diversidade e na nobre função do jornalismo como construção social da realidade, não deformação daltónica, miopista e conspiracionista da verdade, quando não falsificação do real.

Tudo isto, embora para muitos pareça implícito, senão explícito qual é a minha opinião (que carece de um trabalho de pesquisa e análise para que tenha selo de certa verdade), leva-me a questão inicial: há mais jornais, mas há pluralismo em Moçambique?
Ou, por outra: o que significa pluralismo no âmbito da liberdade de imprensa? É termos muitas vozes fazendo-se ouvir e múltiplos personagens dando a cara pensando a mesma coisa e dando a mesma opiniao sobre assuntos dominantes, todos reportando as mesmas coisas e da mesma forma como se de uma unanimidade nacional se tratasse? Pluralismo nos media é uma questão numérica (the more the merrier), ou tem que ver com diversidade de abordagens, de temas, tantas quantas sejam as vozes e caras com espaço aberto para debruçar-se sobre?
Ou por uma outra: dão todos esses jornais semanários da praça mediática nacional maputocêntrica, voice to the voiceless?
PS: aos camaradas de ofício, amantes dos media e do jornalismo vai uma sugestão de leitura e de cinema: o livro Toda a Verdade, de Morris West, sobre o jornalismo de investigação e os condicionalismos éticos e a pretensão de se querer dizer toda a verdade; e o filme Boa noite, e Boa Sorte, de George Clooney, sobre o jornalismo de intervenção na América do McCarthysmo.