quarta-feira, 25 de julho de 2007

Uma questão de método

Caros mozbloguistas, tenho andado ausente da blogosfera acometido por problemas de saúde (tinha de fazer um "break" a minha netmania!), mas estou de volta.
Estou a acompanhar vivamente o debate na blogosfera, em vários fóruns online e mesmo de forma dispersa em páginas de opinião dos jornais que se publicam na capital sobre o fenómeno: Dama do Bling.
Lamento que o jornalismo (semanários estão a dormir) não esteja a capitalizar todas estas valiosas contribuições e faça aquilo que o bom jornalismo aconselha, coligir as várias correntes de opinião, reunir em jeito de folhetim e ampliar para ângulos ainda mais problematizadores o debate, buscando contribuição de sectores conservadores (religião, igreja) e revolucionários (academia, artistas).
Como bem escreveu no último SAVANA o Venâncio Mondlane Jr (um jovem "opinion maker" muito esclarecido, uma "fresh mind"!), o fenómeno Dama do Bling (a Ivânia e ao Valdemiro a minha solidariedade) está a cumprir o seu papel de artista, de revolucionário, de "agitador de consciências" nesta nossa sociedade bastante deficitária em tolerância e cultura de debate (prof. Elísio Macamo, Patrício Langa, Iídio Macia, prof. Carlos Serra convido-vos a constituirem uma comissão instaladora dos "campeonatos nacionais de debates" na academia, com a UEM como embrião).
Voltando aos jornais (e por que não televisões, com documentários/grandes reportagens sobre a transformação que a música/arte está a provocar na nossa sociedade...), estão a perder uma grande oportunidade de agarrar num bom tema social (caros sociólogos: o que são os media hoje em Moçambique, afinal: O espelho da sociedade ou a janela para a sociedade?) e agitarem a sociedade moçambicana.
O fenómeno Dama do Bling, criado pela máquina de multi-media (música como indústria cultural, o mass media televisão) é apenas o, digamos assim, efeito-icebergue, dessa Nação fictícia (prof. EM, permite-me dizer que está-se perante um lugar que não existe?) que assalta o País urbano chamado a "Emergência da MoçAmérica". Sobre a Nação MoçAmérica e seus filhos, ainda estou a elaborar mais a fundo, mas só para terminar esta postagem:
A imprensa semanal está a falhar, talvez não por falta de coragem, mas por UMA QUESTÃO DE (DÉFICE DE) MÉTODO para pegar neste fenómeno mediático chamado Dama do Bling.
Quer queiram quer não, estes Ídolos (de caverna) da Nova Geração, a geração discoteca (a outra caverna segundo Saramago, depois do supermercado), estão a gerar assunto (não eles, mas o que fazem, dizem, representam) para media com bom apetite
Já que temos a mania do "copy and paste" de quase tudo "made in Brazil", por que não olhamos como o Brasil dos Media reflecte sobre o papel social dos seus ídolos da "geração funk"? É uma questão de método...

quinta-feira, 12 de julho de 2007

Bom Jornalismo, sobre os Estados Unidos de África

O Mail & Guardian é uma escola de bom jornalismo em que os nossos semanários deviam inspirar-se. Numa altura em que as lideranças africanas sonham em avançar para os Estados Unidos de África, o M&G faz aqui uma análise interessante, primeiro, sobre as fundações regionais para o desenvolvimento do continente, os blocos regionais. Isto sim, é assunto de interesse público, não meramente de foro académico. Até porque a abordagem permite buscar "estórias da vida real", no nosso caso, de como fenómenos quais "mukherismo", "dealers de carros" ajudam a perceber o que será de Moçambique após a integração regional em 2008.
Irrita-me bastante estar-se sempre a citar o Ministro do "Made In Moçambique" e empresários cépticos e ou optimistas, é mau esse jornalismo de ouvir o que dizem tais líderes e decretar: eis o que nos espera a integração regional!
Vejam a análise do M&G, da (in)eficácia dos blocos regionais/zonas de comércio no fortalecimento dos negócios intra-regionais, para a estabilidade política e como "músculo" para as grandes batalhas internacionais (com UE e no concerto da OMC), para perceber-se que caminho ainda temos de percorrer até que se realize (não como tratado pelos chefes de Estado, mas no dia-a-dia do "mano africano") o sonho de Kwame Nkrumah.
Regozija-me quando o jornalismo cumpre esse seu papel de catalisador de debate das grandes questões que realmente afectam a vida do cidadão, não se a RENAMO pôs fim a boleia da União Eleitoral...
Trade in Africa
10 Jul 2007, Mail & Guardian

JOHANNESBURG: There are an estimated 30 regional trade arrangements (RTAs) in Africa, and, on average, each African country belongs to four RTAs.
The motivation for setting up African RTAs is the desire to stimulate economic growth through regional cooperation, especially for small landlocked African countries, which can gain access to the sea by joining RTAs.
In the context of this week’s discussion at the African Union summit about the formation of a United States of Africa, the Mail & Guardian takes a look at four existing RTAs -- the Southern African Development Community (SADC), the Common Market for Eastern and Southern Africa (Comesa), the Economic and Monetary Union of Central African States (Cemac) and the Economic Community of West African States (Ecowas).
Have RTAs increased intra-African trade?
According to an International Monetary Fund study, RTAs have not been seen to increase intra-African trade significantly. After declining during the Seventies and then recovering in the mid-Eighties to early nineties, intra-African trade is now stagnating at 10% of total African trade -- in spite of increased regional integration efforts. Intra-RTA trade has also not shown a consistent pattern when compared with trade with the rest of the world.
Have RTAs enhanced the share of African trade in overall global trade? Africa’s share in global trade volumes actually declined from 4% in the Seventies to 2% by 2004, including oil exports. Manufactured goods, especially of textiles and clothing -- which often drives export growth in developing countries -- has also stagnated since the Seventies, at 0,5%.
Have RTAs increased African countries bargaining power when it comes to international trade negotiations?
Analysts say that Africa’s bargaining power in international trade negotiations will only be enhanced if African countries adopt common positions, both in terms of other countries lowering trade barriers and in terms of eliminating their own protective mechanisms. In the past, African countries have agreed that the Doha round of the trade talks should be more development oriented and that industrialised nations should increase access to their markets.
However, the devil is in the detail, and there has been little consensus on individual trade issues such as cotton.
Background
Ecowas was created in Togo on November 5 1976, aimed at promoting cooperation over economic, social and cultural activities and, ultimately, a monetary and economic union.
Member states
Benin, Burkina Faso, Cape Verde, Cote d’Ivoire, The Gambia, Ghana, Guinea, Guinea-Bissau, Liberia, Mali, Niger, Nigeria, Senegal, Sierra Leone and Togo.
Institutions established by Ecowas include a community Court of Justice, the Ecowas parliament and the mechanism for conflict prevention, management and resolution, peace and security.
The Ecowas parliament was first convened in May 2002, with 115 MPs representing all member states, except Côte d’Ivoire.
The parliament, which is based in Abuja, Nigeria, plays only an advisory role. The long-term plan is for it to acquire legislative powers and to have directly elected members (current members are drawn from the countries’ national parliaments). It is not clear when this will happen, as the various member states have yet to agree on what powers they are willing to devolve regionally.
Ecowas has tried to help to maintain regional stability through its conflict prevention mechanism, which has the regional mandate for conflict intervention. During the early Nineties Ecowas became heavily involved in the conflict in Liberia, with the deployment of the Ecowas Ceasefire Montoring Group (Ecomog). However, the intervention was controversial because Ecomog troops were seen to be taking sides against Liberian rebel Charles Taylor’s forces. Nonetheless, the deployment was the first by a regional body and Ecomog subsequently intervened in Sierra Leone and Guinea, as well as along the Guinea-Bissau-Senegal border. Many people see Ecomog as the body’s main success, crediting it with preventing larger-scale regional conflict and providing a model for a regional African military force.
At the same time, however, the various interventions also exposed cracks in the regional body, often along Anglophone-Francophone lines.
There are a number of powerful states with different political agendas in Ecowas, a reality which is likely to continue to complicate and delay more profound political and economic integration. At present there is very little coordination or alignment of the member states’ fiscal and monetary policies. A deadline for the establishment of a second monetary union (eight Ecowas member states are already part of the Economic and Monetary Union of West Africa, which shares the CFA franc) by 2004 has not been met, largely because of political and economic differences between member states. Nonetheless, plans to move towards monetary union and to enhance regional integration remain on the agenda.
The Economic and Monetary Community of Central Africa (Cemac)
Background
Cemac was formed on June 25 1999 in Malabo, Equatorial Guinea, as a successor to the Customs and Economic Union of Central Africa (UDEAC), which was formed in 1964.
Member states
Cameroon, Central African Republic, the Republic of Congo, Gabon, Equatorial Guinea and Chad.
Cemac is an effective customs and monetary union, using one currency, the CFA franc, which is used in Francophone countries in West Africa.
In the past eight years Cemac has focused on the following objectives:
* Harmonising economic and financial policy with a view towards creating a common market;
* Coordinating national policies on agriculture, fishing, industry, commerce, tourism, transport, tele­communications and livestock;
* Initiating the process of implementing the free circulation of goods, services, capital and people;
* Coordinating commercial policy and regional economic policy towards other regions; and
* Converging economic and fiscal policy to support and consolidate the monetary union.
Economic and monetary integration
The monetary union is fully functional and managed by a committee of finance ministers from the six member states, through the Bank of Central African States, the union’s central bank. Other areas of effective economic and developmental cooperation include: a common value-added tax, a common programme to enhance macroeconomic performance and stability, international infrastructure rehabilitation projects, a common agricultural policy, forestry policy and recognition by the World Trade Organisation of Cemac as a registered customs and monetary union.
Political integration
Progress in the area of political integration has taken place mostly in matters of security. Cemac member states have adopted a non-aggression, solidarity and mutual assistance pact and in 2002 formed a multinational intervention force for the region. Since then it has deployed members of the force to assist in the stabilisation of the Central African Republic (CAR), where there has been ongoing instability since former president Ange Felix Patasse was ousted by Francois Bozize in March 2003.
Apart from this there has been little progress in political integration. Two of the group’s member states are involved in cross-border conflict linked to instability in both countries, as well as in Darfur. Chadian rebels based in Sudan have made frequent incursions into northeastern CAR, while there are also recurring conflicts over grazing rights between armed Chadian pastoralists and locals in the CAR. In recent months the conflict has started to spread to neighbouring Cameroon, a third Cemac member state.
Southern African Development Community (SADC)
Background
The regional grouping morphed into its present form in 1992 when it changed from the Southern African Development Coordination Conference, formed in 1980, into the Southern African Development Community (SADC).
Member states
Angola, Botswana, the Democratic Republic of Congo, Lesotho, Madagascar, Malawi, Mauritius, Mozambique, Namibia, South Africa, Swaziland, Tanzania, Zambia and Zimbabwe.
Economic and monetary integration
* Population: 230-million.
* Five SADC member states are members of the Southern African Customs Union (Sacu), formed in 1910. These are South Africa, Botswana, Lesotho, Swaziland and Namibia.
* Total European Union imports from SADC: €5,5-billion.
* Trade: in 2002 exports from South Africa made up 17% of total imports within the region. South Africa’s GDP, population and trade dwarf that of its Sacu neighbours.
* Overall, in terms of volume and value, intra-SADC trade is dominated overwhelmingly by South Africa.
* The most heavily SADC-dependent of the member states are Zambia and Malawi, who source 57% and 54%, respectively, of their total imports from fellow SADC members.
* SADC and Sacu are different in outlook. Sacu -- appropriately, since it has been in existence longer -- has covered more ground towards regional integration than SADC, which still has to achieve the status of a free trade area (FTA), a goal it hopes to reach by 2010.
* Sacu is the United States’s second-largest trading partner in Africa after Nigeria, whose chief export is petroleum.
* Analysts say different levels of development in the region mean that smaller economies are always wary of being overrun by companies from the more advanced South Africa.
* Another cause of friction in the region comes from Portugal, former colonial power in Mozambique and Angola. Portugal is seen as South Africa’s main competitor in Angola, -- the petrochemical and diamond economy of which look outward towards its Lusophone kith and kin in Brazil and Portugal.
* An analyst, Albert Makochekanwa, argued that SADC and Sacu don’t necessarily share similar objectives. SADC is more concerned with establishing an FTA, while Sacu is concerned with integrating its member states into the global economy through enhanced trade and investment, as it is already a fully fledged customs union.
* One of SADC’s stated aims is harmonising “political and socio-economic policies and plans of member states”. This has become more difficult since the combustion in Zimbabwe, which was until recently the region’s second-most powerful economy.
* South Africa is the biggest player both in the union and in the community. Makochekanwa points out that in some cases South Africa has entered into trade agreements with which other Sacu members did not agree, but of which they became de facto members.
Common Market for East and Southern Africa (Comesa)
Background
Comesa was formed in 1994 to replace the Preferential Trade Area (PTA), which was formed in 1981. Its founding ambition was the formation of a large economic and trading unit to overcome barriers faced by individual states.
Member states
Angola, Burundi, Comoros, Democratic Republic of Congo, Djibouti, Egypt, Eritrea, Ethiopia, Kenya, Libya, Madagascar, Malawi, Mauritius, Rwanda, Seychelles, Sudan, Swaziland, Uganda, Zambia and Zimbabwe.
Economic and monetary integration
* Economic performance: In 2005 the Comesa region recorded a growth rate of 5,8%.
* Total trade: $159-billion.
* Intra-Comesa trade: $6,3-billion in 2005, $4,5-billion in 2004 and $3-billion in 2000.
* Monetary integration: none; member states use their own currencies or the United States dollar. Comesa wants to achieve a customs union by December next year and a full monetary union by 2025.
* Political integration: maybe because of its size and its sprawling reach, Comesa is perhaps the least integrated of the regional organisations. It is made up of states such as Libya, where elections are not held, and functional democracies such as Zambia.
* Comesa institutions: these are meant to promote sub-regional cooperation. These include the Comesa Trade and Development Bank and the Re-Insurance Company (Zepre) in Nairobi, Kenya; and Comesa Clearing House and Comesa Association of Commercial Banks in Harare, Zimbabwe, the Comesa Leather Institute in Ethiopia. A Court of Justice was established under the Comesa Treaty and became formally operational in 1998.
* Most member states are exporters of raw materials and as a result they can’t trade with one another because most of their exports are geared to Europe, North America and, increasingly, China.
* As a result of its size one obvious problem is overlapping membership, described as a major concern by analysts. According to World Trade Organisation rules, a country cannot belong to more than one customs union with different external tariff agreements.
* Comesa straddles northern and Southern Africa and one obvious problem is the high cost and difficulty of transporting goods. Comesa deputy secretary general Sindiso Ngwenya says border delays cost truck companies up to $400 a day in losses, which are then passed on to the consumer.
* Comesa is looking at establishing a customs union in December next year. This means that members will have to adjust their national tariffs to the agreed common external tariff for raw materials and capital goods.

terça-feira, 10 de julho de 2007

Próximas postagens e uma inspiração

Estou a dever novas leituras diagonais e horizontais aos nossos jornais semanários (vou acrescentar a lista alguns faxes que me chegam).
Assim que o tempo me permitir, postarei igualmente a minha opinião sobre o papel dos media em Moçambique na geração de ídolos, sobretudo da chamada "Indústria Cultural". Dois casos: Os Ídolos da Nova Geração e "Os Filhos da Nação Moçamérica".
Antes, porém, com aquele aceno ao Bayano Valy e ao Ericino de Salema (cá por mim dos mais talentosos jornalistas da "geração pós-4 de Outubro" e, felizmente, amigos meus) aqui vai uma tirada do recentemente libertado do cativeiro Alan Johnston, num email enviado ao Director do BBC College of Journalism, Vin Ray, que pediu a correspondentes da "Bush House" dicas sobre reportagem radiofónica:
The Art of Journalism
“So much of the job is about trying to find the imagination within yourself to try to see, to really see, the world through the eyes of the people in the story. Not just through the eyes of the Palestinian who has just had his home smashed. But also through the eyes of the three young Israelis in a tank who smashed it.
Why did they see that as a reasonable thing to do? What was going through their minds as their tank went through the house?
If you can come close to answering questions like that, then you’ll be giving the whole picture, which is what the BBC must do. And when you are with one side from the conflict, you have got to put to them the very best arguments of the other side - the toughest questions.”

quinta-feira, 5 de julho de 2007

A morte do Semanário em Moçambique II : uma leitura diagonal às manchetes

Vou elaborar umas notas ilustrativas da "agenda da imprensa", através da leitural diagonal dos títulos/temas que os semanários em Maputo. Hoje trago o caso do Zambeze, amanhã olharei para o Magazine Independente de ontem. A análise deixo a cargo dos bloguistas e blogosurfistas.

Títulos de capa do Zambeze de hoje:

1. Com a polícia incapaz: Criminosos controlam Maputo
2. Deserção das FADM: prisão de coronel destapa ociosidade
3. Segundo Edil da Beira: Frelimo inventa estruturas para gastar dinheiro do Estado
4. Soltura do financeiro do fundo pesqueiro: Anti-Corrupção em guerra com Tribunal de Maputo
5. Areias Pesadas de Chibuto: Frelimo nega existência de conflito interno

Esses temas ocupam as primeiras cinco páginas do Zambeze e na sexta página (opinião) o deputado da bancada da RUE no parlamento, Ismael Mussá, na sua coluna Sem o Pé no Travão epigrafa: A partidarização do Estado em Moçambique.

Repare-se nas fontes de informação (anónimas ou ou que dão a cara) das notícias

Denominador comum: Frelimo/defesa e (in)segurança/corrupção
Resumindo: partidarização/politização da esfera mediática

Palavra-chave: círculo vicioso

A morte do Semanário em Moçambique I

Por me ter formado como jornalista, primeiro consumindo semanalmente jornais de referência quais Mail & Guardian, Expresso e o defunto (português) Independente, depois trabalhando em redacções de semanários do país, essa minha experiência convenceu-me de uma coisa: o melhor jornalismo, em geral, e o melhor jornalismo de imprensa, em particular, faz-se num semanário. Porque um semanário possibilita-nos desenvolver um trabalho mais completo, na forma e no conteúdo.
Na forma porque podemos num só tema/matéria praticar/desenvolver em simultâneo vários géneros jornalísticos (a reportagem como colorário de todos eles, a entrevista como complemento daquela, o comentário ou reporter's notebook/apontamento de reportagem e mesmo a crónica, senão mesmo uma análise dos factos) e inserindo neles um estilo que cative/embale o leitor na estória.
No conteúdo porque se nos dá campo para explorar todos os ângulos possíveis para trazer a matéria aprofundada (não precisa propriamente ser extensa), para não dizer praticar aquilo que todos dizemos faltar no jornalismo de imprensa actual e ninguém se digna a "financiar": jornalismo investigativo.

Vem esta introdução a propósito da crise (de criatividade e daí de vendas) dos semanários no país. Quando um jornal faz manchete de um assunto que está na boca do povo, é notícia dos diários, matéria de telejornais com requintes de espectaculosidade, e difundida/debatida em programas de rádio, precisa esse semanário, no mínimo, suscitar interesse no leitor. Dou dois exemplos:
1. o Zambeze de hoje titula na sua capa: Criminosos controlam Maputo. Grande novidade!, tanto mais que limita-se na sua matéria a fazer uma resenha dos casos já reportados para justificar a sua manchete. Algo de novo? Absolutamente!

2. O SAVANA de semana passada faz manchete com uma estória que não é propriamente nova mas o título em si traz algo de novo porque sugere que está em curso no município da Beira uma Revolução Matsanga, com a atribuição do nome de André Matsangaíssa a uma rotunda local e com a proposta em carteira de mais "heróis" beirenses (Dhlakama, Uria Simango, Dom Resende, Dom Jaime Gonçalves) para ruas e praças.
Aquele título suscita, naturalmente, as mais fortes emoções quer do povo (conhecemos o "fenómeno Matsanga" que a propaganda política dos anos oitenta se nos inculcou à mente), quer da Frelimo ao salpicar a sua auto-estima... e obviamente eleva de certa maneira o orgulho beirense, o berço da Resistência contra certa hegemonia política étnico-regional solidificada nas lideranças da frente/depois partido/depois Governo-Estado...

Em Moçambique, os jornais semanários só resistirão à primeira morte (entanto que falência do seu modelo de informação ou do papel que desempenham no panorama da informação) e à segunda e definitiva morte (quebra de vendas e posterior falência/desaparecimento do título da praça) se souberem aplicar a fórmula que o bloguista/estudioso de jornalismo Juan Antonio Giner sugere num texto que ele intitulou de "The Death Of The Weekly" (A Morte do Semanário): "Like newspapers, news magazines can not survive just digesting last week’s news. Explain and advance. Anticipatory journalism is the new name of the game."
Traduzindo, ele avisa: "como os jornais, revistas de informação não podem sobreviver de simplesmente resumirem/recapitularem notícias da semana anterior. Explicar e avançar. Jornalismo antecipatório é o novo nome do jogo".
Eu acrescentaria: contar estórias, entanto que exploração da matéria de uma modo narrativo cativante...

Só assim, perante a hegemonia na captação da grande publicidade (corporativa ou estatal) detida pelo Notícias, a ameaça conjuntural dos Jornais Gratuítos, o lugar de "agenda setter" assumido pelo agressivo (sensacionalista) jornalismo da STV é que semanários como SAVANA, Zambeze, Magazine Independente vingarão...

Desaparecimento do jornal meia-noite

Surgiu há alguns meses um jornal semanário que muito prometia e que trazia com ele três novidades: o preço de capa baratíssimo (7,00 meticais contra 20,00 meticais da generalidade dos semanários) para um volume de pelo menos 4o páginas por edição, uma equipa de colaboradores/colunistas respeitáveis (passaram por lá Lourenço do Rosário, Elísio Macamo, Calane da Silva, Ungulani Ba Ka Khossa, Jorge Dias nas artes plásticas...) e tinha ainda a Produções LUA para obras literárias. Esta, noticiada pelo jornal O País como editora pertença do cidadão Armando Guebuza, chegou a publicar dois livros, um de Elísio Macamo (Um País Cheio de Soluções) e outro de poesia do poeta Armando Guebuza.

Subitamente, desapareceu das prateleiras. A mesma sorte já tiveram jornais que se pretendiam (e chegaram a ser) de referência como DEMOS, EMBONDEIRO...
E há bem pouco tempo Salomão Moyana vendeu o Zambeze e aventurou-se para um jornal a cores e impresso na África do Sul, designado peculiarmente por MAGAZINE INDEPENDENTE.

Nos últimos anos tem sido assim, nascem e morrem jornais, os quais basicamente são novidade apenas pelo título, mas não trazem nada de propriamente novo na forma e no conteúdo. É de louvar o passo que Salomão Moyana deu: a cor e quatro páginas em língua inglesa. Mas, será que isso bastará para vencer no mercado editorial nacional?
O que está a falhar no panorama da imprensa escrita nacional, à qual podemos acrescentar as publicações electrónicas (abundam jornais FAX que na generalidade passam as mesmas notícias e nem em estilo divergem), para que se firmem?

O Consumismo em Maputo reflectido na nova onda dos media

Todos os dias, Maputo brinda-nos com um carnaval de "modernices" que pretendem celebrar o seu cosmopolistismo. Não fosse pelo festival de "outdoors" - uma forma de media (publicidade) que está a vingar ao ponto de uma festa de uma VIP filha de um ex-chefe da mola, na "catedral" da noite moçambicana (vocês sabem do que eu estou a falar...), ter sido objecto de propaganda numa das zonas mais "in" da cidade -, os quais atribuem novos motivos de decoração dos grandes prédios da capital, é a televisão que revela o "state of mind" da geração entretenimento: a anteceder ao chamado "prime time", vejam lá nas outras privadas com que programas disputam audiências os Diálogos de Anabela Adrianopoulos...

Claramente, aquilo que os sociólogos designaram por um dos Mitos do Desenvolvimento, o Consumismo, está a ter reflexos no universo dos media em Maputo, atacando agora o sector da imprensa. Habituados a queixarem-se de o Notícias (pela sua ligação ao "establishment") açambarcar a "parte do leão" da publicidade (uma das fontes de rendimento da imprensa) e enquanto não conseguem se tornar apelativos aos leitores (logo, mais publicidade por força do seu "readership") através de uma revolução nos seus conteúdos, os jornais privados (mormente semanários) ainda não despertaram para a nova ameaça à sua sobrevivência.
Quiçá, tão só reflexo de uma tendência crescente de consumismo exacerbado e desprovido do senso crítico no "modus vivendi" do cidadão maputense, eis que surgiram os Jornais Gratuítos Promocionais. Só para citar alguns exemplos, há o Bom & Barato, há o "Facto!" do supermecado Game, há o 9PROMO do jovem empresário de media Nelson Camal (dono da rádio 9FM).
Na essência, esses jornais são "montras de papel", que procuram capturar o cidadão senão para se tornar comprador, comprador e comprador, ao menos "Window Shopper" (como diria o rapper americano 50Cent). Informação por produto agitador/gerador de consciência do cidadão, esse não faz parte de tais jornais... De cidadão estamos a virar Clientes.
Faço um convite à filosofia, para os habitantes da nossa blogosfera, pelas seguintes questões: Como sobreviverão/responderão os jornais privados de facto, difusores de informação, perante o ataque dos gratuítos? O que a emergência/existência desses jornais gratuítos (de grandes tiragens) diz da sociedade urbana maputense, a tal que falsifica a imagem de Moçambique no mundo?

O Expresso do Oriente que África tomou, depois do descalabro do TGV ocidental

Belíssima análise de Jeffrey Sachs sobre a lição que a China está a dar a Bretton Woods. Apetece-me sugerir que África está, enfim, a apanhar o Expresso do Oriente rumo ao desenvolvimento, depois de ter embalado para um desastre espectacular provocado pelo TGV (Train de Grand Vitesse/Trem de Grande Velocidade) ocidental que cultivou nos nossos dirigentes a tese do mercado completamente livre.

É uma golfada de ar fresco ler Sachs, um estímulo a lermos melhor em como a "penetração chinesa" talvez seja menos neo-colonial do que tomamos e mais benéfica, porquanto trata-se de África reerguer o seu parque infra-estrutural que erigirá as fundações inabaláveis do desenvolvimento. A meu ver, tendo quadros competentes e uma governação cada vez menos politizada nos próximos vinte e cinco anos em diante (claramente os "históricos" libertadores da pátria já estarão na melhor das hipóteses a curtir a reforma), Moçambique terá activos o bastante para que qualquer endividamento externo não comprometa o desenvolvimento. Talvez com a China se possa finalmente traduzir para a prática esse conceito baptizado de "parceria inteligente"...


China’s lessons for the World Bank

As the World Bank clings to its free-market ideology, China is providing more practical help for developing countries.
The China Daily recently ran a front-page story recounting how Paul Wolfowitz used threats and vulgarities to pressure senior World Bank staff. The newspaper noted that Wolfowitz sounded like a character out of the mafia television show The Sopranos. At the same time, while the Wolfowitz scandal unfolded, China was playing host to the Africa Development Bank (ADB), which held its board meeting in Shanghai. This is a vivid metaphor for today’s world: while the World Bank is caught up in corruption and controversy, China skilfully raises its geopolitical profile in the developing world.China’s rising power is, of course, based heavily on its remarkable economic success. The ADB meeting took place in the Pudong district, Shanghai’s most remarkable development site. From largely unused land a generation ago, Pudong has become a booming centre of skyscrapers, luxury hotels, parks, industry, and vast stretches of apartment buildings. Shanghai’s overall economy is currently growing at around 13% per year, thus doubling in size every five or six years. Everywhere there are startups, innovations, and young entrepreneurs hungry for profits.I had the chance to participate in high-level meetings between Chinese and African officials at the ADB meetings. The advice that the African leaders received from their Chinese counterparts was sound, and much more practical than what they typically get from the World Bank.
Chinese officials stressed the crucial role of public investments, especially in agriculture and infrastructure, to lay the basis for private-sector-led growth. In a hungry and poor rural economy, as China was in the 1970s and as most of Africa is today, a key starting point is to raise farm productivity. Peasant farmers need the benefits of fertiliser, irrigation, and high-yield seeds, all of which were a core part of China’s economic takeoff.
Two other critical investments are also needed: roads and electricity, without which there cannot be a modern economy. Farmers might be able to increase their output, but it won’t be able to reach the cities, and the cities won’t be able to provide the countryside with inputs. The officials stressed how the government has taken pains to ensure that the power grid and transportation network reaches every village in China.
Of course, the African leaders were most appreciative of the next message: China is prepared to help Africa in substantial ways in agriculture, roads, power, health, and education. And the African leaders already know that this is not an empty boast. All over Africa, China is financing and constructing basic infrastructure. During the meeting, the Chinese leaders emphasised their readiness to support agricultural research as well. They described new high-yield rice varieties, which they are prepared to share with their African counterparts.
All of this illustrates what is wrong with the World Bank, even aside from Wolfowitz’s failed leadership. Unlike the Chinese, the bank has too often forgotten the most basic lessons of development, preferring to lecture the poor and force them to privatise basic infrastructure, rather than to help the poor to invest in infrastructure and other crucial sectors.
The bank’s failures began in the early 1980s, when, under the ideological sway of President Ronald Reagan and prime minister Margaret Thatcher, it tried to get Africa and other poor regions to cut back or close down government investments and services. For 25 years, the bank tried to get governments out of agriculture, leaving impoverished peasants to fend for themselves. The result has been a disaster in Africa, with farm productivity stagnant for decades. The bank also pushed for privatisation of national health systems, water utilities, and road and power networks, and grossly underfinanced these critical sectors.
This extreme free-market ideology, also called “structural adjustment”, went against the practical lessons of development successes in China and the rest of Asia. Practical development strategy recognises that public investments - in agriculture, health, education, and infrastructure - are necessary complements to private investments. The World Bank has instead wrongly seen such vital public investments as an enemy of private-sector development.
Whenever the bank’s extreme free-market ideology failed, it has blamed the poor for corruption, mismanagement, or lack of initiative. This was Wolfowitz’s approach, too. Instead of focusing the bank’s attention on helping the poorest countries to improve their infrastructure, he launched a crusade against corruption. Ironically, of course, his stance became untenable when his own misdeeds came to light. The bank can regain its relevance only if it becomes practical once again, by returning its focus to financing public investments in priority sectors, just as the Chinese leadership is prepared to do.
The good news is that African governments are getting the message on how to spur economic growth, and are also getting crucial help from China and other partners that are less wedded to extreme free-market ideology than the World Bank. Many African governments at the Shanghai meeting declared their intention to act boldly, by investing in infrastructure, agricultural modernisation, public health, and education.
The Wolfowitz debacle should be a wake-up call to the World Bank: it must no longer be controlled by ideology. If that happens, the bank can still do justice to the bold vision of a world of shared prosperity that prompted its creation after the second world war.

quarta-feira, 4 de julho de 2007

Rendição ao Capital

O meu ex-mestre e colega de profissão Jeremias Langa, acabadinho de chegar da terra do tio sam, nem tanto deslumbrado tipo "Soy Loco Por Ti America!", antes denotando equilíbrio nas suas "autópsias aos Estados Unidos", brinda-nos esta semana na sua coluna "em jeito de fecho" com uma crónica que, fora procurando compreender o antagonismo (as diferenças e pluralidades que fazem deste mundo globalizado ainda melhor) entre o a América do "bling bling" e o Islão extremista, revela mais do que tudo a sua conversão ao Capital, esse espectro que Marx avisou ameaçava a Europa há uns séculos e hoje é o Deus.
A conclusão de Jerry é lapidar: Tudo gira, então, em torno de... dinheiro. E ainda alguém é capaz de dizer que o dinheiro não compra tudo?

Não resisto, pois, a fazer um convite à filosofia, para que os sociólogos que abundam na nossa blogosfera dêem o seu parecer a esta rendição de um líder de opinião. Na mesma semana, aliás, em que o Editor do MAGAZINE INDEPENDENTE, Lourenço Jossias também releva a sua rendição ao capital. Os jornalistas, afinal, deixaram de ser revolucionários? abandonaram a esquerda? passaram do lado do proletário para a bancada dos capitalistas?

A América e o Islão
29/06/2007
Jeremias Langa
Os Estados Unidos da América e os estados árabes são uma espécie de duas faces, aparentemente, irreconciliáveis. Os EUA são um país excessivamente liberal para encontrar espaço nos rígidos e por vezes inflexíveis padrões do Islão. O Islão é demasiado conservador para ser aceitável nos paradigmas da cultura americana. Do mesmo jeito que é inaceitável a uma americana a ideia de não poder tocar, beijar e namorar com um homem em público, é inconcebível aos olhos do Islão que uma mulher apareça em revistas ou na TV completamente nua. São duas realidades não só diferentes, como por vezes, na maioria das vezes, melhor dizendo, antagónicas.
Na verdade, a relação entre a América e o Islão nunca foi propriamente sadia. Primeiro, por força da crescente influência americana no Médio Oriente e, sobretudo, do incondicional apoio de Washington a Israel.
Sendo amigo do seu inimigo, a América passou a ser, para os estados árabes, também ela um inimigo de estimação, uma espécie de país infiel, que profana o Islão por força do seu, por vezes, excessivo liberalismo. O episódio do 11 de Setembro veio apenas exacerbar os ânimos, pelo facto de os americanos, desde então, terem associado o terrorismo ao Islão.
Sucede, no entanto, que após o 11 de Setembro o número de muçulmanos que procura viver na América disparou em flecha e, hoje, há pouco mais de 6 milhões de cidadãos professantes do Islão que escolheram o espaço territorial dos Estados Unidos da América para fazer a vida. Contraditório, não é?
Contraditório ou não, certo é que a América está, estranhamente, a se transformar num espaço privilegiado de fecundação daquilo que mais parece abominar, pelo que hoje já há um considerável número de cidadãos americanos assumidamente muçulmanos.
Isto remete-me a duas leituras. A primeira: de que estamos em presença de uma prova cabal de que é também da acomodação das suas contradições que se constroem as grandes nações. A segunda: de que os interesses económicos tendem a superar todas as diferenças, mesmo que elas sejam ideologicamente profundas.
Por isso, a América abomina o Islão, mas não desdenha o valor acrescentado que os seus professantes levam à sua musculada economia. O mesmo sucede com os muçulmanos: odeiam a América, as suas políticas, as suas gentes, mas adoram o bem-estar e as oportunidades que a prosperidade americana lhes proporciona.
Tudo gira, então, em torno de... dinheiro. E ainda alguém é capaz de dizer que o dinheiro não compra tudo?